sexta-feira, 6 de julho de 2007

ELAS...PARA O MUNDO E ETERNIDADE (ou eu queria ter dito isso)

Um pouco mais e eles serão cumplices. Ela vai lhe explicitar desejos, dos mais secretos. Vai lhe falar dos seios, das fendas, de sexo. Ela vai lhe excitar a textura, dar vida ... sua matéria. Vai lhe encher de fantasias, de gozo, de carnes. Ela vai lhe contar o proibido, o imoral. Vai lhe falar o que as bocas lavadas calam com pudor. Ela vai se despir da vergonha. Um pouco mais e eles serão cúmplices, ali mesmo, sobre a mesa da escrivaninha. A mão da mulher alisa o papel em branco. Mas recua.” CASSANDRA RIOS

“Aquilo que ainda vai ser depois – é agora. Agora é o domínio de agora. E enquanto dura a improvisação eu nasço. E eis que depois de uma tarde de “quem sou eu” e de acordar à uma hora da madrugada ainda em desespero - eis que às três horas da madrugada acordei e encontrei-me. Fui ao encontro de mim. Calma, alegre, plenitude sem fulminação. Simplesmente eu sou eu. E você é você. É vasto, vai durar. O que te escrevo é um “isto”. Não vai parar: continua...” Água Viva – CLARICE LISPECTOR

DO DESEJO "E por que haverias de querer minha alma Na tua cama? Disse palavras líquidas, deleitosas, ásperas. Obscenas, porque era assim que gostávamos. Mas não menti gozo prazer lascívia .Nem omiti que a alma está além, buscando Aquele Outro. E te repito: por que haverias De querer minha alma na tua cama? Jubila-te da memória de coitos e de acertos. Ou tenta-me de novo. Obriga-me." (Da Noite - 1992) HILDA HILST

AMIGA “Deixa-me ser a tua amiga, Amor, A tua amiga só, já que não queres Que pelo teu amor seja a melhor A mais triste de todas as mulheres. Que só, de ti, me venha magoa e dor O que me importa a mim? O que quiseres É sempre um sonho bom! Seja o que for, Bendito sejas tu por mo dizeres! Beijá-me as mãos, Amor, devagarinho... Como se os dois nascessemos irmãos, Aves cantando, ao sol, no mesmo ninho... Beija-mas bem!... Que fantasia louca Guardar assim, fechados, nestas mãos, Os beijos que sonhei pra minha boca!...” FLORBELA ESPANCA

MEU DESTINO  “Nas palmas de tuas mãos leio as linhas da minha vida. Linhas cruzadas, sinuosas, interferindo no teu destino. Não te procurei, não me procurastes – íamos sozinhos por estradas diferentes. Indiferentes, cruzamos Passavas com o fardo da vida... Corri ao teu encontro. Sorri. Falamos. Esse dia foi marcado com a pedra branca da cabeça de um peixe. E, desde então, caminhamos juntos pela vida...” CORA CORALINA

"Não existe isso de homem escrever com vigor e mulher escrever com fragilidade. Puta que pariu, não é assim. Isso não existe. É um erro pensar assim. Eu sou uma mulher. Faço tudo de mulher, como mulher. Mas não sou uma mulher que necessita de ajuda de um homem. Não necessito de proteção de homem nenhum. Essas mulheres frageizinhas, que fazem esse gênero, querem mesmo é explorar seus maridos. Isso entra também na questão literária. Não existe isso de homens com escrita vigorosa, enquanto as mulheres se perdem na doçura. Eu fico puta da vida com isso. Eu quero escrever com o vigor de uma mulher. Não me interessa escrever como homem."
"que o outro não me considere sempre disponível." LYA LUFT

(MRS. DALLOWAY)“Horrível, pensava, adivinhar mover-se nela aquele monstro brutal! ouvir ramos estrelejando e sentir aqueles cascos nas profundezas dessa floresta cheia de folhas, a alma; nunca estar inteiramente alegre, nem inteiramente segura, pois a qualquer momento o animal podia estar movendo-se; ódio que, especialmente depois da sua doença, fazia-lhe sentir um doloroso arrepio na espinha; causava-lhe uma dor física, todo o prazer da beleza, da amaizade, do bem-estar, de sentir-se amada, de tornar a casa deliciosamente acolhedora, tudo vacilava e pendia, como se na verdade houvesse um monstro a roer as raízes, como se toda a panóplia do contentamento não fosse mais que amor-próprio! e aquele ódio!”

ÚLTIMA CARTA A LEONARD WOOLF
“Querido,
Tenho certeza de que estou enlouquecendo de novo.
Sinto que não podemos passar por outra daquelas terríveis fases. E desta vez não ficarei curada. Começo a ouvir vozes, e não posso me concentrar.
Assim, estou fazendo o que me parece melhor.
Você me deu a maior felicidade possível. Não creio que duas pessoas pudessem ser mais felizes até chegar esta doença terrível. Não consigo mais lutar. Sei que estou estragando sua vida e que sem mim você poderá trabalhar. E você vai, eu sei. Estávendo, nem consigo mais escrever adequadamente. Não consigo ler. O que quero dizer é que devo a você toda a felicidade da minha vida. Você foi absolutamente paciente comigo e incrivelmente bom. Quero dizer isso —e todo mundo sabe. Se alguém pudesse me salvar, teria sido você. Perdi tudo, menos a certeza da sua bondade. Não posso mais continuar estragando sua vida. Não creio que duas pessoas tenham sido mais felizes do que nós fomos.” VIRGINIA WOOLF

“Por vezes a palavra representa um modo mais acertado de se calar do que o silêncio”.

“A minha liberdade não deve procurar captar o ser, mas desvendá-lo.” SIMONE DE BEAUVOIR

"Sumi porque só faço besteira em sua presença, fico mudo quando deveria verbalizar, digo um absurdo atrás do outro quando melhor seria silenciar, faço brincadeiras de mau gosto e sofro antes, durante e depois de te encontrar. Sumi porque não há futuro e isso não é o mais dificil de lidar, pior é não ter presente e o passado ser mais fluido que o ar. Sumi porque não há o que se possa resgatar, meu sumiço é covarde mas atento, meio fajuto meio autêntico, sumi porque sumir é um jogo de paciência, ausentarse é risco e sapiência, pareço desinteressado, mas sumi para estar para sempre do teu lado, a saudade fará mais por nós do que nosso amor e sua desajeitada e irrefletida permanência."

(TRECHO DE O DIVÃ) “Sempre desprezei as coisas mornas, as coisas que não provocam ódio nem paixão, as coisas definidas como mais ou menos, um filme mais ou menos, um livro mais ou menos. Tudo perda de tempo. Viver tem que ser perturbador, é preciso que nossos anjos e demônios sejam despertados, e com eles sua raiva, seu orgulho, seu asco, sua adoração ou seu desprezo. O que não faz você mover um músculo, o que não faz você estremecer, suar, desatinar, não merece fazer parte da sua biografia.” MARTHA MEDEIROS 

segunda-feira, 21 de maio de 2007

quinta-feira, 26 de abril de 2007

NÃO CONTO!

Na vida a gente não pode contar tudo o tempo todo... Porque tudo pode ser um dia jogado contra você. Suas fraquejas despejadas de bandeja... Mas não conto que li isso na internet e achei a brincadeira interessante...
Não conto que sou melhor com palavras escritas do que as faladas. Não conto que quando eu era criança eu corria atrás dos meus pais para alcançá-los no mar e caia na beirada e bebia muita água salgada e uma vez peguei pneumonia. Não conto que aprendi a andar de bicicleta com um senhor, acordei tão decidida que eu caia e levantava com os joelhos machucados, até que esse senhor (talvez imaginário) segurava a bicicleta e ajudava a me equilibrar. Não conto que quando meus pais se separaram eu fiquei tão triste que afetou minha fala. Às vezes quando eu tinha quer ler algo eu gaguejava e isso foi um pesadelo na minha infância, imagina. Não conto que quando eu jogava Hand, uma vez eu deixei a bola cair para o outro time tentar alcançar o placar e por mais que todos sabiam da verdade eu dizia (e digo) que havia tropeçado (elas estavam sendo arrasadas, não achei certo!). Não conto que odeio perder e isso às vezes é complicado, porque na vida alguém falou que não podemos ganhar tudo. Não conto que mentir não é meu forte, mas às vezes omito para não magoar e acabo me magoando. Não conto que odeio ver sangue e às vezes quando vejo tenho a sensação que vou desmaiar, Não conto que minha mãe queria que eu fosse medica e me dava brinquedos sobre a profissão e eu trocava por outros brinquedos qualquer, até figurinha. Não conto que adorava subir em arvores e ver tudo de cima quando eu era criança e umas das minhas frustrações era não ter morado em arvore. Não conto que roubava amora do vizinho. Não conto que com 6 anos eu era a única criança do colégio que sabia cantar o hino- nacional, imagina. Não conto que já pensei em montar um grupo que luta por justiça e pela dignidade das pessoas. Não conto que já pensei em matar um político. Não conto que um dos hinos que mais gosto é – ou viver a pátria livre ou morrer pelo Brasil. Não conto que adoro fazer amor no cinema. Não conto que sou movida a adrenalina, não conto que uma vez tocou meu interfone e eu não atendi, mesmo ouvindo...fiquei com medo de perder uma pessoa. E logo em seguida a pessoa do interfone sofreu um acidente e ficou dias internado...acabei perdendo a pessoa de qualquer jeito (ela não morreu, calma!). Não conto que adoro chorar em filmes e às vezes até alguma musica ou foto me comove. Não conto (apesar de que, todos sabem) que o meu “oi” e “bom dia” são desafinados e eu sou uma pessoa desafinada e se um dia eu precisar disso par conquistar alguém, estou ferrada! Não conto que tive um amigo imaginário chamado Peter, depois um passarinho chamado Peter e depois um amigo de verdade chamado Peter e que me deixou ao ir morar no Arizona, mas que ainda somos amigos não com a mesma intensidade... Também não conto que adoro cachecol e pessoas que falam francês. Não conto que sou geniosa, carente e ansiosa e tenho insônia (meu! quanto defeito, isso não conto de jeito nenhum). Não conto que não gostava de gatos e agora eu amo gatos, não sei viver sem minhas gatas de bigode. Não conto que tive uma cachorra chamada Alice e que penso nela até hoje, como se fosse alguém da minha família. Não conto que eu largaria Sampa para morar no Rio, Não conto que menti dizendo que não era apaixonada por ela, porque não faria diferença...Não conto que adoro pisar na grama com os pés descalços, mas em Sampa o que me relaxa é andar de Tênis, Não conto que para me alegrar basta um copo de mojito... Não conto que não quero envelhecer e que tenho medo de morrer, imagina. Não conto que estou sofrendo e que não posso contar para ninguém, porque eu não posso desmoronar.Imagina...Valéria Telles desmoronando...imagina mesmo... Não conto que nesse exato momento estou com vontade de gritar... não conto, não conto...não conto. Não conto que tenho as vezes medo de morar sozinha e que eu moro sozinha, não conto que tenho medo de filme de terror. Não conto que meu sonho era ser Peter Pan,imagina...Não conto que gostaria de pisar na Lua ou em Marte ou em Saturno. Não conto que quando fico nervosa não consigo me comunicar e que estou escrevendo agora para me reconfortar... valéria telles

quarta-feira, 4 de abril de 2007

Explodem fogos de artifício

Sempre acreditei que existem sentimentos impossíveis de descrever com palavras. Mas ao mesmo tempo escrevo para dar emoções aos acontecimentos e esse é sentido de tudo que vejo, sinto e penso...e por que não tentar descreve-los?
Passei 2 anos da minha vida fechada para balanço, me questionando sobre um passado presente, tentando achar outros tipos de realizações. Ficando, mais não me entregando, entende? Coloquei na minha cabeça que para todas as pessoas que passaram pela minha vida eu tinha deixado um pouco do meu eu e para ela. Para o meu passado-presente eu tinha me deixado por inteira.
E agora, ando rindo a toa – você faz suas escolhas suas escolhas fazem você, será? Minha alma inquieta é que não relaxa nunca. Mas que encontrou aconchego em outro ser, um ser ainda irreal, ainda tão mais confuso, ainda no meu pedestal. A armadura se afrouxa, o sorriso se solta, as palavras se atropelam...

Quando penso em transformar meus livros em roteiro. Sempre penso em uma cena....tente imagina-la. A cena se passa em Sampa, na chuva, com um beijo demorado, molhado. E por algum motivo eles na chuva se viram para sentidos opostos. Dois sentimentos nesse instante se completam e se tornam um -o êxtase do beijo e a dor da despedida. Um dos personagens acha que já aconteceu tudo, suspira e tenta seguir seu caminho rumo ao sonho. O outro protagonista ainda sentindo o gosto dos lábios do outro ser, volta. A cena é congelada e nesse momento tudo recomeça. Sampa, a chuva, o beijo, o molhado...a sensação Há! A sensação de entrar em erupção, de fogos de artifícios explodirem dentro do peito...Essa sensação única poderia durar a vida inteira.
Hoje quando eu abri a pagina de noticias da uol, fiquei surpresa com tanta chuva que caiu na cidade. Mas tentem entender eu estava extasiada, segura e feliz...

"O sabiá no sertão
Quando canta me comove
Passa três meses cantando
E sem cantar passa nove
Porque tem a obrigação
De só cantar quando chove...
...Seu boiadeiro por aqui choveu
Seu boiadeiro por aqui choveu
Choveu que amarrotou
Foi tanta água que meu boi nadou"

quinta-feira, 29 de março de 2007

Poderia ter sido bom, poderia ter sido especial, poderia...

Por que não sou capaz de viver as superfícies? Por que sempre fico me aprofundando intensamente em tudo? Sempre imaginando que algo me surpreenda e que oportunidades não podem ser perdidas. Intensidade ou idiotice? Talvez minha fé tenha sido mais uma vez abalada.
Sofri pela madrugada... Não por ela e sim pela situação criada e o meu mundo imaginário desfeito. Senti-me indefesa como há muito tempo não me sentia – festa estranha com gente esquisita - naquele momento eu só a tinha, momentaneamente, estava vivendo e suspirando por ela... Como ela conseguiu fazer meu mundo entrar em erupção? Lembrei até um dos meus primeiros livros “Meu pé de laranja lima” – Por que, meu querido, Portuga, contam mentiras às criancinhas? Se eu disser que foi mágico, se eu disser que não foi Baco e se eu disser que foi um suspiro profundo. Todas as alternativas... O pior é que outros perdidos nos acharam e o que ainda de momento não era evidente. Outras pessoas foram além... Casal bonito, casal apaixonado, quanto tempos vocês estão juntas? Na verdade acreditei naquilo e a resposta: - estamos juntas só há 10 minutos! Só tinha passado 10 minutos? Às vezes perco o tempo, o espaço e o barulho.
Não sei, não sei... blog - psicólogo é mais barato que terapia,rs.

Minha vontade era perguntar a ela...Você sempre afasta as pessoas que se aproximam da sua vida? Poderia ter sido bom, poderia ter sido especial, poderia... Mas, tenta-la magoa-la não me faria se sentir melhor...

Será que um dia a gente se da conta das pessoas que passam pela nossa vida sem a gente realmente perceber? Pessoas que entram em nossas vidas destinadas a partir... E agente não investe por medo, por não ser o momento, mas se não for o momento quando vai ser? Acho que depois de meses acordando em camas estrangeiras e sem meus olhos mudarem de cor...não! é melhor não falar...
Talvez não seja ela, mas até quando vou enxerga-la no meu pedestal.. Será preciso achar buracos em manteigas, garrafas de água vazias na geladeira, folhas verdes cortadas em pratos de porcelana, pastas de dentes amassadas pela metade... Talvez eu nunca saiba, talvez o momento tenha acabado e a incógnita o meu pior pesadelo... Poderia ter sido bom, poderia ter sido especial, poderia...

quarta-feira, 28 de março de 2007

PARA UMA AVENCA PARTINDO

Esse conto do Caio Fernando Abreu me fascina e é com ele que vou começar escrever esse blog...

- Olha, antes do ônibus partir eu tenho uma porção de coisas pra te dizer, dessas coisas que não se dizem costumeiramente, sabe, dessas coisas tão difíceis de serem ditas que geralmente ficam caladas, porque nunca se sabem nem como serão ditas e nem como serão ouvidas, compreende? olha falta muito pouco tempo, e se eu não te disser agora talvez eu não diga nunca mais, porque tanto eu como você sentiremos satisfeitos com tudo o que existimos, porque elas não foram existidas completamente, entende, porque as vivemos apenas naquela dimensão que é permitido viver, não, não é isso que é quero dizer, não existe uma dimensão permitida e uma outra proibida, indevassável, não me entenda mal, mas é que a gente tem tanto medo de penetrar naquilo que não sabe se terá coragem de viver, no mais fundo, eu quero dizer, é isso mesmo, você está acompanhando o meu raciocínio? falava no mais fundo, desse que existe em você, em mim em todos esses outros com suas malas, suas bolsas, suas maças, não, não sei porque todo mundo compra maças antes de viajar, nunca tinha pensado nisso, por favor, não me interrompa, realmente não sei, existem coisas que a gente ainda não pensou, que a gente talvez nunca pense, eu por exemplo nunca pensei que houvesse alguma coisa a dizer além de tudo o que já foi dito, ou melhor pensei sim, não, pensar propriamente não, mas eu sabia, é verdade que eu sabia, que havia uma outra coisa atrás dos silêncios, aqueles silêncios saciados, quando a gente descobria alguma coisa pequena para observar, um fio de luz coado pela janela, um latido de cão no meio da noite, você sabe que eu não falaria dessas coisas se não tivesse a certeza de que você sentia o mesmo que eu, a respeito dos fios de luz, dos latidos de cães, é, eu não falaria, uma vez eu disse que a nossa diferença fundamental é que você era capaz apenas de viver as superfícies, enquanto eu era capaz de ir no mais fundo de não sentir medo desse fundo, você riu porque eu dizia que não era cantando desvairadamente até ficar rouca que você ia conseguir saber alguma coisa a respeito de si própria, mas sabe você tinha razão em rir daquele jeito porque eu também não tinha me dado conta de que enquanto ia te dizendo aquelas coisas eu também cantava desvairadamente até ficar rouco, o que eu quero dizer é que nos dois cantamos desvairadamente até agora sem nos darmos conta, é por isso que estou tão rouco assim, não, não é essa coisa de garganta que falo, é de outra, de dentro, entende? por favor não ria dessa maneira nem fique consultando o relógio o tempo todo, não é preciso, deixa eu te dizer antes que o ônibus parta que você cresceu em mim dum jeito completamente insuportável, assim como você fosse apenas uma simples semente e eu plantasse você esperando ver nascer uma plantinha qualquer, pequena, rala, uma avenca, talvez uma samambaia, no máximo uma roseira, é, não estou sendo agressivo não, esperava de vocês apenas coisas assim, avenca, samambaia, roseira, mas nunca, em nenhum momento essa coisa enorme que me obrigou a abrir todas as portas, e pouco a pouco derrubar todas as paredes e arrancar o telhado para que você crescesse livremente, você não crescia se eu a mantivesse presa num pequeno vaso, eu compreendi a tempo que você precisa de muito espaço, claro que compro uma revista pra você, eu sei, é bom ler durante a viagem, embora eu prefira ficar olhando pela janela e pensando coisas, estas mesmas coisas que estou tentando dizer a você sem consegui, por favor, me ajuda, senão vai ser muito tarde, daqui a pouco não vai ser mais possível, e se eu não disser tudo não poderei nem dizer nem fazer mais nada, é preciso que a gente tente de todas as maneiras, é o que estou fazendo, sim, está é a minha última tentativa, olha, é bom você pegar sua passagem, porque você sempre perde tudo nessa sua bolsa, não sei como é que você consegue, é bom você ficar com ela na mão para evitar qualquer atraso, sim, é bom evitar os atrasos, mas agora escuta: eu queria te dizer uma porção de noites, ou tardes, ou manhãs, não importa a cor, é, a cor, o tempo é só uma questão de cor, não, é? pois não importa, eu queria era te dizer dessas vezes em que eu te deixava e depois saía sozinho, pensando numa porção de coisas que eu ia te dizer depois, pensando também nas coisas que eu ia te dizer, porque existem coisas terríveis que precisam ser ditas, não faça essa cara de espanto, elas são realmente terríveis, eu me perguntava se você era capaz de ouvir se você, não sei, disponibilidade suficiente para ouvir, sim, era preciso estar disponível para ouvir, disponível em relação a que? não, sei, não me interrompa agora que estou quase conseguindo, disponível só, não é uma palavra bonita? sabe, eu me perguntava até que ponto você era aquilo que eu via em você ou apenas aquilo que eu queria ver em você, eu queria saber até que ponto você não era apenas uma projeção daquilo que eu sentia, e, se era assim, até quando eu conseguiria ver em você todas essas coisas que me fascinavam e que no fundo sempre no fundo, talvez nem fossem suas, mas minhas, e pensava que amar era só não consegui ver, e desamar era não mais conseguir, entende? dolorido – colorido, estou repetindo devagar para que você possa compreender, melhor, claro que dou um cigarro pra você, não, ainda não, faltam uns cinco minutos, eu sei que não devia fumar tanto, é, eu sei que os meus dentes estão ficando escuros, e essa tosse intolerável, você acha mesmo a minha tosse intolerável? eu estava dizendo, o que é mesmo que eu estava dizendo? ah! sabe, entre duas pessoas essas coisas sempre devem ser ditas, o fato de você achar minha tosse intolerável, por exemplo, eu poderia me aprofundar nisso e concluir que você não gosta de mim o suficiente, porque, se você gostasse, gostaria também da minha tosse, dos meus dentes escuros, mas não aprofundando não concluo nada, fico só querendo te dizer de como eu te esperava quando a gente marcava qualquer coisa,de como eu olhava o relógio e andava de lá pra cá sem pensar definitivamente em nada, mas não, não é isso, eu queria chegar mais perto que está lá no centro e que um dia descobrir existindo, porque eu nem suponha que existisse, acho que foi o fato de você partir que me fez descobrir tantas coisas, espera um pouco, eu vou te dizer de todas as coisas, por isso que estou falando, fecha a revista, por favor, olha, se você não prestar atenção você não vai conseguir entender nada, sei, sei, eu também gosto muito de Peter Fonda, mas isso agora não tem nenhuma importância, é fundamental que você escute todas as palavras, todas, e não fique tentando descobrir sentidos ocultos por trás do que estou dizendo, sim, eu reconheço que muitas vezes falei por metáforas, e que é chatíssimo falar por metáforas, pelo menos para quem ouve, e depois, você sabe, eu sempre tive essa preocupação idiota de dizer apenas coisas que não ferissem, está bem, eu espero aqui do lado da janela, é melhor mesmo você subir, continuamos conversando enquanto o ônibus não sai, espera, as maças ficam comigo, é muito importante, vou dizer tudo em uma só frase, você vai........................................................................................................................................
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...................sim, sei, eu vou escrever, não, eu não vou escrever, mas é bom botar um casaco, está esfriando tanto, depois na estrada, olha, antes do ônibus partir eu quero te dizer uma porção de coisas, será que vai dar tempo? escuta, não fecha a janela, está tudo definido aqui dentro, é só uma coisa, espera um pouco mais, depois você arruma as malas e as bolsas, fica tranqüila, esse velho não vai incomodar você, olha, eu ainda não disse tudo e a culpa é única e exclusivamente sua, por que você fica sempre me interrompendo e me fazendo suspeitar que você não passa mesmo duma simples avenca? eu preciso de muito silêncio de muita concentração para dizer todas as coisas que eu tinha pra te dizer, olha, antes de você ir embora eu quero te dizer quê