quinta-feira, 29 de março de 2007

Poderia ter sido bom, poderia ter sido especial, poderia...

Por que não sou capaz de viver as superfícies? Por que sempre fico me aprofundando intensamente em tudo? Sempre imaginando que algo me surpreenda e que oportunidades não podem ser perdidas. Intensidade ou idiotice? Talvez minha fé tenha sido mais uma vez abalada.
Sofri pela madrugada... Não por ela e sim pela situação criada e o meu mundo imaginário desfeito. Senti-me indefesa como há muito tempo não me sentia – festa estranha com gente esquisita - naquele momento eu só a tinha, momentaneamente, estava vivendo e suspirando por ela... Como ela conseguiu fazer meu mundo entrar em erupção? Lembrei até um dos meus primeiros livros “Meu pé de laranja lima” – Por que, meu querido, Portuga, contam mentiras às criancinhas? Se eu disser que foi mágico, se eu disser que não foi Baco e se eu disser que foi um suspiro profundo. Todas as alternativas... O pior é que outros perdidos nos acharam e o que ainda de momento não era evidente. Outras pessoas foram além... Casal bonito, casal apaixonado, quanto tempos vocês estão juntas? Na verdade acreditei naquilo e a resposta: - estamos juntas só há 10 minutos! Só tinha passado 10 minutos? Às vezes perco o tempo, o espaço e o barulho.
Não sei, não sei... blog - psicólogo é mais barato que terapia,rs.

Minha vontade era perguntar a ela...Você sempre afasta as pessoas que se aproximam da sua vida? Poderia ter sido bom, poderia ter sido especial, poderia... Mas, tenta-la magoa-la não me faria se sentir melhor...

Será que um dia a gente se da conta das pessoas que passam pela nossa vida sem a gente realmente perceber? Pessoas que entram em nossas vidas destinadas a partir... E agente não investe por medo, por não ser o momento, mas se não for o momento quando vai ser? Acho que depois de meses acordando em camas estrangeiras e sem meus olhos mudarem de cor...não! é melhor não falar...
Talvez não seja ela, mas até quando vou enxerga-la no meu pedestal.. Será preciso achar buracos em manteigas, garrafas de água vazias na geladeira, folhas verdes cortadas em pratos de porcelana, pastas de dentes amassadas pela metade... Talvez eu nunca saiba, talvez o momento tenha acabado e a incógnita o meu pior pesadelo... Poderia ter sido bom, poderia ter sido especial, poderia...

quarta-feira, 28 de março de 2007

PARA UMA AVENCA PARTINDO

Esse conto do Caio Fernando Abreu me fascina e é com ele que vou começar escrever esse blog...

- Olha, antes do ônibus partir eu tenho uma porção de coisas pra te dizer, dessas coisas que não se dizem costumeiramente, sabe, dessas coisas tão difíceis de serem ditas que geralmente ficam caladas, porque nunca se sabem nem como serão ditas e nem como serão ouvidas, compreende? olha falta muito pouco tempo, e se eu não te disser agora talvez eu não diga nunca mais, porque tanto eu como você sentiremos satisfeitos com tudo o que existimos, porque elas não foram existidas completamente, entende, porque as vivemos apenas naquela dimensão que é permitido viver, não, não é isso que é quero dizer, não existe uma dimensão permitida e uma outra proibida, indevassável, não me entenda mal, mas é que a gente tem tanto medo de penetrar naquilo que não sabe se terá coragem de viver, no mais fundo, eu quero dizer, é isso mesmo, você está acompanhando o meu raciocínio? falava no mais fundo, desse que existe em você, em mim em todos esses outros com suas malas, suas bolsas, suas maças, não, não sei porque todo mundo compra maças antes de viajar, nunca tinha pensado nisso, por favor, não me interrompa, realmente não sei, existem coisas que a gente ainda não pensou, que a gente talvez nunca pense, eu por exemplo nunca pensei que houvesse alguma coisa a dizer além de tudo o que já foi dito, ou melhor pensei sim, não, pensar propriamente não, mas eu sabia, é verdade que eu sabia, que havia uma outra coisa atrás dos silêncios, aqueles silêncios saciados, quando a gente descobria alguma coisa pequena para observar, um fio de luz coado pela janela, um latido de cão no meio da noite, você sabe que eu não falaria dessas coisas se não tivesse a certeza de que você sentia o mesmo que eu, a respeito dos fios de luz, dos latidos de cães, é, eu não falaria, uma vez eu disse que a nossa diferença fundamental é que você era capaz apenas de viver as superfícies, enquanto eu era capaz de ir no mais fundo de não sentir medo desse fundo, você riu porque eu dizia que não era cantando desvairadamente até ficar rouca que você ia conseguir saber alguma coisa a respeito de si própria, mas sabe você tinha razão em rir daquele jeito porque eu também não tinha me dado conta de que enquanto ia te dizendo aquelas coisas eu também cantava desvairadamente até ficar rouco, o que eu quero dizer é que nos dois cantamos desvairadamente até agora sem nos darmos conta, é por isso que estou tão rouco assim, não, não é essa coisa de garganta que falo, é de outra, de dentro, entende? por favor não ria dessa maneira nem fique consultando o relógio o tempo todo, não é preciso, deixa eu te dizer antes que o ônibus parta que você cresceu em mim dum jeito completamente insuportável, assim como você fosse apenas uma simples semente e eu plantasse você esperando ver nascer uma plantinha qualquer, pequena, rala, uma avenca, talvez uma samambaia, no máximo uma roseira, é, não estou sendo agressivo não, esperava de vocês apenas coisas assim, avenca, samambaia, roseira, mas nunca, em nenhum momento essa coisa enorme que me obrigou a abrir todas as portas, e pouco a pouco derrubar todas as paredes e arrancar o telhado para que você crescesse livremente, você não crescia se eu a mantivesse presa num pequeno vaso, eu compreendi a tempo que você precisa de muito espaço, claro que compro uma revista pra você, eu sei, é bom ler durante a viagem, embora eu prefira ficar olhando pela janela e pensando coisas, estas mesmas coisas que estou tentando dizer a você sem consegui, por favor, me ajuda, senão vai ser muito tarde, daqui a pouco não vai ser mais possível, e se eu não disser tudo não poderei nem dizer nem fazer mais nada, é preciso que a gente tente de todas as maneiras, é o que estou fazendo, sim, está é a minha última tentativa, olha, é bom você pegar sua passagem, porque você sempre perde tudo nessa sua bolsa, não sei como é que você consegue, é bom você ficar com ela na mão para evitar qualquer atraso, sim, é bom evitar os atrasos, mas agora escuta: eu queria te dizer uma porção de noites, ou tardes, ou manhãs, não importa a cor, é, a cor, o tempo é só uma questão de cor, não, é? pois não importa, eu queria era te dizer dessas vezes em que eu te deixava e depois saía sozinho, pensando numa porção de coisas que eu ia te dizer depois, pensando também nas coisas que eu ia te dizer, porque existem coisas terríveis que precisam ser ditas, não faça essa cara de espanto, elas são realmente terríveis, eu me perguntava se você era capaz de ouvir se você, não sei, disponibilidade suficiente para ouvir, sim, era preciso estar disponível para ouvir, disponível em relação a que? não, sei, não me interrompa agora que estou quase conseguindo, disponível só, não é uma palavra bonita? sabe, eu me perguntava até que ponto você era aquilo que eu via em você ou apenas aquilo que eu queria ver em você, eu queria saber até que ponto você não era apenas uma projeção daquilo que eu sentia, e, se era assim, até quando eu conseguiria ver em você todas essas coisas que me fascinavam e que no fundo sempre no fundo, talvez nem fossem suas, mas minhas, e pensava que amar era só não consegui ver, e desamar era não mais conseguir, entende? dolorido – colorido, estou repetindo devagar para que você possa compreender, melhor, claro que dou um cigarro pra você, não, ainda não, faltam uns cinco minutos, eu sei que não devia fumar tanto, é, eu sei que os meus dentes estão ficando escuros, e essa tosse intolerável, você acha mesmo a minha tosse intolerável? eu estava dizendo, o que é mesmo que eu estava dizendo? ah! sabe, entre duas pessoas essas coisas sempre devem ser ditas, o fato de você achar minha tosse intolerável, por exemplo, eu poderia me aprofundar nisso e concluir que você não gosta de mim o suficiente, porque, se você gostasse, gostaria também da minha tosse, dos meus dentes escuros, mas não aprofundando não concluo nada, fico só querendo te dizer de como eu te esperava quando a gente marcava qualquer coisa,de como eu olhava o relógio e andava de lá pra cá sem pensar definitivamente em nada, mas não, não é isso, eu queria chegar mais perto que está lá no centro e que um dia descobrir existindo, porque eu nem suponha que existisse, acho que foi o fato de você partir que me fez descobrir tantas coisas, espera um pouco, eu vou te dizer de todas as coisas, por isso que estou falando, fecha a revista, por favor, olha, se você não prestar atenção você não vai conseguir entender nada, sei, sei, eu também gosto muito de Peter Fonda, mas isso agora não tem nenhuma importância, é fundamental que você escute todas as palavras, todas, e não fique tentando descobrir sentidos ocultos por trás do que estou dizendo, sim, eu reconheço que muitas vezes falei por metáforas, e que é chatíssimo falar por metáforas, pelo menos para quem ouve, e depois, você sabe, eu sempre tive essa preocupação idiota de dizer apenas coisas que não ferissem, está bem, eu espero aqui do lado da janela, é melhor mesmo você subir, continuamos conversando enquanto o ônibus não sai, espera, as maças ficam comigo, é muito importante, vou dizer tudo em uma só frase, você vai........................................................................................................................................
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...................sim, sei, eu vou escrever, não, eu não vou escrever, mas é bom botar um casaco, está esfriando tanto, depois na estrada, olha, antes do ônibus partir eu quero te dizer uma porção de coisas, será que vai dar tempo? escuta, não fecha a janela, está tudo definido aqui dentro, é só uma coisa, espera um pouco mais, depois você arruma as malas e as bolsas, fica tranqüila, esse velho não vai incomodar você, olha, eu ainda não disse tudo e a culpa é única e exclusivamente sua, por que você fica sempre me interrompendo e me fazendo suspeitar que você não passa mesmo duma simples avenca? eu preciso de muito silêncio de muita concentração para dizer todas as coisas que eu tinha pra te dizer, olha, antes de você ir embora eu quero te dizer quê